Artigo de luxo? Um pai que volta pra casa. Se a moda é o zeitgeits, a @misci__ vem contando a história de um Brasil real através de suas construções de semiótica que vão além das caricaturas tradicionais de tropicalidade. Porque no fim, sabemos que esse país de mil cores é cheio de cicatrizes e números que impressionam pelo absurdo — desde ser o que mais mata transexuais no mundo, passando por altos índices de feminicídio, até o abandono paterno.
Depois da celebração em torno da coleção “Eva Mátria”, em uma ode não romântica às mães solos do Brasil e como elas precisaram ser multiplas enquanto os pais abriram mão de suas famílias por escolha e poucos julgamentos sociais, @aironmartin pela primeira vez traduz o seu sentimento pessoal em uma campanha do Dia dos Pais e aponta aqueles que retornam para casa.
“Já fiz três campanhas do Dia das Mães porque tenho o que falar. No Dia dos Pais, sempre fiquei em silêncio porque não sabia o que comunicar respeitando a minha verdade. Era só o silêncio”, diz Airon.
Com o ditado popular “cagando e andando”, o modelo lê no jornal a notícia que 500 crianças são registradas por dia sem o pai na certidão de nascimento. Num país que tem pavor ao aborto, o abandono paterno é o ato legalizado pelo machismo estrutural.
Na indústria da moda existem várias as empresas que se sustentam vendendo roupas. Mas poucas são as que se posicionam vendendo moda. Talvez seja por isso que a Misci vem se destacando dentro e fora do Brasil, por olhar sem medo para a nossa realidade e, de uma forma ou de outra, traduzir em imagens o que muitos dentro dos seus privilégios preferem esconder, ou fingir que não existe.
E que bom que temos a oportunidade de poder olhar para a moda além da ótica do fútil, estereótipo enraizado durante muito tempo através da frivolidade do consumo desenfreado por peças passageiras.
A moda do Brasil está viva e se constrói escancarando a realidade da nossa indústria e sociedade, não contando histórias de outros países e fortalecendo marcas internacionais em uma adoração do eurocentrismo.
Que o nosso amor pelo consumo nacional volte, assim como o regresso dos pais na campanha da Misci.