Até os céticos que assistiram o documentário “Franca: Chaos and Creation”, trazendo um vislumbre da mente criativa da ex-editora chefe da Vogue Itália, Franca Sozzani (1950 – 2016), podem entender didaticamente que nenhuma capa de moda é por acaso ou que não esteja ligada ao reflexo do tempo. É o zeitgeist no papel.
Aqui no Brasil, essa sempre foi uma pauta latente. Mesmo com a turma nascida digitalmente se aprofundando nos conteúdos rápidos, as capas das publicações nacionais ainda são chancelas e seguem no pódio da relevância dentro da indústria – seja uma new face estrelando, uma nova marca entrando –, capaz de transformar em star até quem não tem talento.
Se em poucos dias o debate sobre a imagem valer mais que mil palavras foi posto em voga por conta da montagem criada por IA do Papa usando roupas pop, por aqui, eu penso que o que os nossos olhos podem ver ainda tem muito a nos contar.
Preste bem atenção nas mudanças de layouts das principais publicações. Todas ou a maior parte delas estão investindo em uma estética mais minimalista. Um logo (que vai validar) e uma representação imagética da moda (que perpetua o stylist, a modelo ou influencer, já que o Brasil tem tesão em números). Sem manchetes, chamadas ou letras garrafais. O que sobra é a imagem. E essa materialização dependendo do contexto que está inserida, já basta.
No melhor estilo quiet, as capas comunicam. Ora é uma marca nacional facista ganhando espaço de um lado, ora é a cover girl que confraterniza com o ex-presidente Bolsonaro de outro. Então, ficamos à mercê desse sistema. E não podemos jamais normalizar que as questões de relacionamentos interpessoais sejam banalizadas na área criativa.
Ser filha de alguém influente não pode te validar e colocar numa capa.
Tudo bem que a moda sempre pendeu para o lado onde o dinheiro é o hino do sucesso, as redações precisam se manter. Mas seguir fingindo que um veículo não conta a nossa história, é se abster de tudo que conquistamos em prol de uma comunicação democrática.
Não é nem saudosismo, mas a vontade de perpetuar o que deu certo na moda, o sentido. Uma capa política pode movimentar estruturas e moldar realidades.
Franca, mi manchi.