Qualquer bom árbitro da moda masculina há de concordar que poucos itens tem um caráter tão sutil, controverso e político quanto o cropped. Não é de hoje que a peça sofre uma certa discriminação do “público tóxico masculino”. Vítima da vez, o ator @joaoguilherme se tornou alvo de insultos virtuais após postar uma foto usando o item durante em Paris.
A percepção de que um homem usando um cropped deve ser gay e, no mínimo, feminino, é quase irônica, já que a ascensão do cropped é rastreada a partir de uma das atividades mais hipermasculinas de todos os tempos: o futebol americano. As camisas de futebol estavam constantemente sendo rasgadas durante os jogos, expondo os torsos e abdominais dos jogadores. Essa “exposição acidental” originou uma tendência no início dos anos 80 de jogadores deliberadamente cortando suas camisas para mostrar seus corpos esculpidos.
Para quem cresceu entre os anos 80 e 90, a referência pode se tornar um pouco mais nítida: você irá lembrar do filme “Rocky III” de 1982, em uma cena em que Carl Weathers ostenta a camisa cropped;
ou até mesmo do clássico de terror “A Hora do Pesadelo”, com a estreia de Johnny Depp, em 1984.
Déjà vu total para quem assistiu quando Will Smith, apareceu em “Um Maluco no Pedaço”, em 1990, com uma camisa cropped.
Mas, no final dos anos 80, a imagem do cropped começa a mudar. Se antes a camiseta recortada reforçava um padrão de masculinidade, marcada pelo culto ao corpo, esporte e atletismo, nesse novo caminho ela ganha outro significado, é a partir da figura do cantor Prince, em Wembley, em 1986, que o cropped passa por um rebrand.
A medida que o cropped ganhava uma nova identidade nos anos 90, o público hetero-masculino se distanciava ainda mais do item. A represália que envolvia as questões de gênero também partia de um contexto muito mais amplo: a crise da HIV/AIDS; o advento de políticas como Don’t Ask Don’t Tell, e o brutal assassinato do jovem gay Matthew Shepard, nos EUA.
Embora todo o ideal de virilidade imposto pela masculinidade frágil, o cropped também acrescenta um leve ato sutil de emancipação – uma avaliação de como as roupas ficam emaranhadas na expectativa social.
collab: @matheushab